Casos de Injúria Racial Crescem no RN; Só 20% dos Casos São Julgados

 Adriano AbreuDados do Estado mostram um crescimento sucessivo do número de casos. Apenas 20 processos foram julgados desde 2020

Dados do Estado mostram um crescimento sucessivo do número de casos. Apenas 20 processos foram julgados desde 2020


 O Rio Grande do Norte registrou, entre janeiro e abril deste ano, 43 denúncias de crimes de injúria racial, segundo dados da Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análises Criminais (Coine), órgão da Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social (Sesed). Para efeitos de comparação, em 2019 foram sete registros no mesmo período. Os dados deste ano apontam, portanto, para um crescimento de 514,28% na quantidade de notificações.
 
Já o número de processos julgados de 2020 até essa sexta-feira (3), representam apenas 20% do quantitativo de denúncias registradas nos quatro primeiros meses de cada ano, desde 2019. Os dados da Coine indicam um crescimento sucessivo no número de notificações de crimes de injúria racial nos primeiros quatro meses dos últimos anos. Se em 2019 foram notificados apenas sete casos, em 2022, a quantidade subiu para 20; em 2021, foram 30 notificações, além das 43 registradas neste primeiro quadrimestre de 2022.

O quantitativo de todos esses anos soma 100 casos notificados no Rio Grande do Norte. Os processos julgados pelo Tribunal de Justiça (TJRN), por sua vez, chegam a 20, de 2020 para cá. O TJ não informou se houve julgamentos em 2019.  A Corte informou, no entanto que, de 2018 a maio de 2022, foram recebidos 137 processos sobre a tipificação criminal (quatro em 2018; sete em 2019, 37 em 2020, 59 em 2021 e 30 nestes primeiros meses de 2022).

O TJ explicou que a diferença entre os registros da Polícia e os processos recebidos pela Corte se dá porque os dados são referentes a “fases distintas”, uma vez que o “julgamento é a última fase do processo”, enquanto que os números da Coine podem se tratar de inquéritos abertos, na fase inicial. 

Segundo o Tribunal de Justiça, cada processo tem uma “dinâmica própria, e não há como responder sobre quanto tempo cada um poderá levar para ser julgado”. De acordo com o TJRN, dos casos julgados de 2020 até aqui, na maior parte (7) foi estabelecida perda do direito de ação em razão do decurso de tempo ou inércia do autor da queixa-crime da ação penal, que impede o processo de prosseguir.

Também houve casos julgados (3) que contaram com a renúncia do queixoso (quem faz a queixa) ou perdão aceito, além de ausência das condições da ação (2), renúncia ao direito pelo autor, retratação do agente, dentre outros.

Aumento tem a ver com conscientização

O aumento de casos de injúria racial registrados, segundo fontes ouvidas pela TRIBUNA DO NORTE, tem a ver, dentre outros pontos, com uma maior conscientização, por parte das vítimas, da tipificação criminal.

“Os avanços que nós temos com relação às conquistas dos movimentos sociais, à abertura do poder público para ouvir as demandas específicas dessa população e o debate cada vez maior na mídia e nas redes sociais, despertou nas pessoas uma consciência racial. Com isso, elas conseguem enxergar os atos de injúria”, explica o secretário de Igualdade Racial, Direitos Humanos, Diversidade, Pessoas Idosas e Pessoas com Deficiência de Natal, Pedro Venâncio.

Uma maior conscientização sobre o crime também é apontada por Renato Santos, integrante do Coletivo Enegrecer no Rio Grande do norte, como um fator que contribui para a soma dos registros ao longo dos anos. De acordo com ele, no entanto, esta não é a única justificativa. 

“O avanço do conservadorismo no Brasil está diretamente ligado ao racismo. Nesse aspecto,  temos visto, no País inteiro, o avanço de uma violência muito sintomática, que passa por um processo de legitimação, a partir, justamente, do avanço do conservadorismo”, diz. “Mas o crescimento de notificações se dá, ainda, pelo nível de consciência que a gente tem desenvolvido no sentido de dar respostas  a isso”, completa.

Santos afirma que a população tem buscado as vias institucionais de denúncia para conseguir dar vazão a essas situações. A coordenadora estadual de Promoção de Igualdade Racial, Giselma Omilê, pontua que o crescimento reflete os esforços do Estado em contribuir para que a violência contra pessoas negras não fiquem no rol das subnotificações.

“O RN tem criado estratégias, como canais de denúncia e acolhimento. Na Semjidh [Secretaria de Estado das Mulheres, da Juventude, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos], nós temos a Ouvidoria Geral dos Direitos Humanos, com uma coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial, que no âmbito da sua transversalidade, tem dialogado com as demais políticas, colocando o recorte  étnico racial para pensar as ações de enfrentamento ao racismo”, explicou Giselma.

O fato de os registros de injúria racial junto à polícia terem aumentado não significa, necessariamente, que a prática do crime aumentou. Na verdade, ele sempre existiu, mas agora passou a ser um dado oficial, conforme esclarece a coordenaria estadual de Igualdade Racial. “A partir do momento em que o Estado cria mecanismos para que isso [as denúncias] ocorra, a situação  deixa de ser algo que fica apenas no campo do território da vítima e passa a ser um registro formalizado”, diz a coordenadora.
 
 
 
 
#Fonte: Tribuna do Norte
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