RN: Arcebispo de Natal explica Sínodo, propõe escuta ampla e comenta polarização

O primeiro Sínodo da Arquidiocese de Natal foi oficialmente aberto no último dia 7 de junho, na Catedral Metropolitana. Mas o que está em curso não é apenas um evento religioso, e sim um processo longo e profundo, que se estenderá até o final de 2026. O objetivo principal: escutar o povo, avaliar a realidade pastoral e, a partir disso, construir um novo Diretório da Arquidiocese, com orientações atualizadas para liturgia, sacramentos, administração e evangelização.
Nesta terça-feira (10), em entrevista ao Jornal da Manhã, da Jovem Pan News Natal (93,5 FM), o arcebispo metropolitano, Dom João Santos Cardoso, explicou as motivações, a metodologia e a importância deste processo. “O Sínodo Diocesano não é apenas um evento; é um processo. E esse processo tem um objetivo muito claro: realizar uma ampla escuta, não só entre os fiéis católicos que frequentam nossas igrejas, mas também entre os que estão afastados e até mesmo entre os que não professam a fé católica”, afirmou.
A palavra “sínodo” vem do grego e significa “caminhar juntos”. Segundo Dom João, essa caminhada começa com uma escuta ativa e sincera. A fase de escuta vai de junho a agosto de 2025 e envolverá todas as 123 paróquias da Arquidiocese, distribuídas em 88 municípios.
“Queremos ouvir os formadores de opinião, os setores influentes da sociedade, mas também aqueles que não têm voz, que vivem no anonimato, os esquecidos. É uma consulta abrangente, porque acreditamos que todos têm algo a contribuir com a missão da Igreja”, afirmou Dom João.
A coleta de dados será realizada principalmente por meio de um questionário aplicado pelas equipes da Pastoral da Comunicação (Pascom), com jovens comunicadores atuando presencialmente em espaços religiosos e públicos. “A consulta será realizada com base em uma metodologia simples, mas bastante abrangente. A Pastoral da Comunicação será responsável por coordenar esse processo. Cada paróquia da Arquidiocese possui uma equipe da Pascom, geralmente formada por jovens comunicadores, pessoas interessadas na missão de evangelizar por meio da comunicação. Essas equipes foram treinadas para aplicar um questionário ao povo em geral, incluindo os católicos que frequentam as missas. A ideia é colher a opinião das pessoas por meio de enquetes, com perguntas objetivas. O acesso ao questionário será feito através do link, mas também por meio de abordagens presenciais — em locais como feiras, pontos de ônibus, praças, enfim, onde o povo está”, explicou.
Além da consulta geral, ocorrerão assembleias paroquiais com um caráter mais aprofundado, voltadas aos que já caminham na vida da Igreja. “Essas assembleias terão uma dimensão orante, porque não escutamos só as pessoas — escutamos, em primeiro lugar, o Espírito Santo”, acrescentou.
O Diretório Pastoral da Arquidiocese, atualmente em vigor, foi publicado em 2015 com caráter experimental de dois anos. Quase uma década depois, a decisão de revisá-lo se impôs. Mas, ao contrário de entregá-lo a uma comissão de especialistas, a Arquidiocese optou por fazer esse trabalho em sintonia com as vozes do povo.
“Essa escuta abre novas perspectivas de evangelização. Precisamos compreender o momento em que estamos vivendo, com mudanças culturais profundas, novos costumes e uma nova realidade religiosa no Brasil e no Rio Grande do Norte”, declarou.
Pesquisa do Censo
A entrevista também abordou os dados do último Censo do IBGE. O número de católicos vem diminuindo nas últimas décadas — hoje, representam cerca de 57% da população brasileira e 67% da potiguar. Dom João reconhece esse desafio com realismo e responsabilidade. “A presença da Igreja tem diminuído, especialmente na região metropolitana de Natal. Cidades como Parnamirim, São Gonçalo e áreas turísticas como Baía Formosa mostram esse retrato”, afirmou.
Para o arcebispo, fatores como a migração e o desraizamento religioso nas grandes cidades contribuem para essa queda. “Quem sai do interior e vem para a capital muitas vezes perde o vínculo com as tradições. Precisamos de mais agilidade, especialmente dos leigos e leigas, para alcançar essas novas periferias urbanas”, disse.
O crescimento de outras religiões e também do grupo dos “sem religião” — muitos dos quais têm espiritualidade, mas não pertencem a nenhuma instituição — também foi abordado. Dom João ressaltou que o papel da Igreja não é competir, mas compreender e cuidar.
“Esses dados do Censo devem servir de alerta, não para concorrência, mas para que possamos falar com mais clareza ao coração do nosso povo. Especialmente aos jovens, onde nossa presença também vem diminuindo”, alertou.
Contra a polarização, fidelidade à palavra de Deus
Dom João também comentou sobre a politização de espaços religiosos, especialmente em algumas igrejas evangélicas. Citando uma análise de uma pesquisadora do ISER, ele fez um alerta: “A razão é clara: a política partidária, por sua natureza, divide. Ela separa. Já o Evangelho deve unir. A Igreja precisa estar atenta a esse risco de se deixar levar pela onda da polarização. É fundamental que respeitemos as preferências ideológicas e partidárias das pessoas, mas sem transformar nossos espaços litúrgicos em palanques”.
Para o arcebispo, o anúncio do Evangelho precisa tocar o essencial da vida humana: o sentido da existência, a esperança na eternidade, a busca por Deus. Dom João reafirmou a importância de preservar a missão essencial da Igreja: “Quem procura uma igreja não está buscando uma orientação eleitoral. Existem outros espaços legítimos na sociedade para esse tipo de discussão. A missão da Igreja é diferente. Ela deve falar de Deus e responder às grandes inquietações humanas com o anúncio do Reino, e não com palavras de ordem partidária.”